Antes de um enfarte ou AVC, o corpo avisa
Os sinais que quase todos ignoram
Investigação mostra que mais de 99% dos casos de doença cardíaca, enfarte e AVC dão sinais de alerta antes de acontecer
Antes de ocorrer um enfarte, um AVC ou outra doença cardiovascular, quase sempre existem sinais de alerta, aponta um estudo.
Esses sinais de alerta são fatores de risco amplamente conhecidos para as doenças cardíacas, mas é possível fazer mais para diminuir o número de casos, conclui uma investigação publicada no Journal of the American College of Cardiology.
Para este estudo, os investigadores analisaram dados de dois grupos: mais de 600 mil casos de doença cardiovascular na Coreia do Sul e outros mil casos nos Estados Unidos.
Os investigadores analisaram que percentagem desses casos tinha sido precedida por fatores de risco tradicionais para doenças cardiovasculares, incluindo níveis de tensão arterial, açúcar no sangue, colesterol e tabagismo.
Em mais de 99% dos casos de doença cardiovascular, insuficiência cardíaca ou AVC, o paciente apresentava pelo menos um destes fatores de risco antes do incidente, mostram os dados.
“Mesmo aumentos ‘ligeiros’ nestes quatro fatores devem ser tratados com mudanças de estilo de vida ou medicação”, afirma Philip Greenland, um dos autores principais do estudo, por email. Greenland é também professor de Cardiologia Harry W. Dingman e professor de Medicina Preventiva na Feinberg School of Medicine da Universidade Northwestern, em Chicago.
Para lá dos diagnósticos
O estudo é particularmente importante porque reforça que médicos e pacientes podem gerir os fatores de risco em quase todos os casos de doença cardíaca, afirma Susan Cheng, professora e vice-presidente de investigação no departamento de cardiologia do Smidt Heart Institute, no Cedars-Sinai Medical Center, em Los Angeles. Cheng não esteve envolvida na investigação.
Alguns estudos sugerem que um número crescente de casos de doença cardiovascular não apresenta indicadores de risco tradicionais. Isso pode significar que, embora a medicina já tenha abordado os fatores que é possível controlar, outros elementos ainda pouco compreendidos pelos investigadores possam também desempenhar um papel – e, por isso, ainda não existem boas estratégias de prevenção, acrescenta Cheng.
O que distingue esta investigação, explica, é que os cientistas não se limitaram a diagnósticos de diabetes ou hipertensão para determinar se existiam fatores de risco – analisaram os dados clínicos completos dos pacientes.
Por vezes, o fato de alguém não ter um diagnóstico de tensão alta ou açúcar elevado não significa que os seus níveis não representem risco.
E ao observar um conjunto mais alargado de dados médicos, os investigadores descobriram que quase todos os casos apresentavam fatores de risco tradicionais e modificáveis nos registos antes do desenvolvimento da doença cardiovascular, aponta Cheng.
Assim, se médicos e pacientes quiserem reduzir o risco de doença cardíaca, o melhor caminho continua a ser controlar os fatores conhecidos, como o açúcar no sangue, a tensão arterial, o colesterol e o consumo de tabaco, acrescenta.
Não é uma luta contra o envelhecimento, é melhorar a longevidade
A medicina aprendeu muito sobre doenças cardíacas no último século – e o conhecimento comum sobre como preveni-las mantém-se consistente há muitos anos, diz Karen Joynt Maddox, professora de medicina na área da cardiologia na Washington University Medical School, em St. Louis, Missouri. Também não esteve envolvida no estudo.
Mesmo assim, implementar essas mudanças continua a ser um desafio. Parte do problema é a natureza abstrata do risco cardiovascular, explica Joynt Maddox.
Quando um paciente já tem uma doença, é mais fácil motivar mudanças e implementar tratamentos, refere. Mas é mais difícil comunicar de forma eficaz a importância de agir perante riscos que só se materializam no futuro.
Outro obstáculo é o fato de introduzir medicamentos ou protocolos para reduzir o risco cardiovascular poder ser associado ao processo de envelhecimento, o que pode parecer assustador ou desmotivante para alguns doentes, afirma Ahmed Tawakol, cardiologista do Massachusetts General Hospital e professor associado de medicina na Harvard Medical School, que também não participou na investigação.
Em vez disso, encara-o como um caminho para melhorar a longevidade. Controlar a tensão arterial, o açúcar no sangue e o colesterol não significa perder nada – significa proteger a vida e a saúde, ganhando mais anos para se sentir bem e fazer o que realmente importa, aponta.
Resultados clínicos e hábitos saudáveis
Embora os fatores de risco para doenças cardiovasculares se mantenham consistentes, a tecnologia para os controlar evoluiu.
Gerir a tensão arterial é muitas vezes um bom ponto de partida e ter um medidor de tensão em casa já permite acompanhar os níveis, explica Joynt Maddox. Depois, deve trabalhar-se com o médico para monitorizar os fatores de risco e definir um plano de acompanhamento.
Para além dos fatores de risco clínicos estudados, é igualmente essencial melhorar os fatores de risco ligados ao estilo de vida, sublinha Tawakol.
Dormir bem, fazer exercício, manter uma alimentação equilibrada, um peso saudável e baixos níveis de stress são fundamentais para reduzir o risco cardiovascular, diz.
“Por exemplo, o stress e a depressão revelaram-se fatores de risco tão potentes quanto o tabaco e a diabetes”, acrescenta.
“Espero que, quanto mais insistirmos e mostrarmos a eficácia de tratar todos estes aspetos em conjunto, mais pessoas adotem esta abordagem combinada e possam realmente desfrutar de vidas mais longas e saudáveis.”



